Um dia de manhã, ao ir para o trabalho, me deparei com a seguinte cena: dois carros da polícia parados, na contra mão, e quatro policiais, um revistando um jovem negro enquanto outros dois apontavam armas para ele, e o terceiro se comunicava pelo rádio com alguém.

À primeira vista e com certa dose de preconceito, admito, pensei se tratar de um bandido que fora pego em flagrante. Menos de um minuto depois, o jovem negro foi liberado, e um dos carros desceu a contra mão cantando pneus, enquanto o outro ficou ali parado mais um tempo. O jovem apenas caminhava e, aparentemente, se segurava para não chorar.

Isso levantou em mim a seguinte questão:

Você já parou para pensar em quantas coisas que são tão comuns para você que você automaticamente assume que todos também têm aquilo?

Se não, faça o seguinte exercício: Você já viu um estranho na rua caminhando atrás de você, e acelerou o passo por medo de que ele te estuprasse? Você já foi agredido apenas por estar de mãos dadas com seu amor? Já foi ofendido apenas por causa da roupa que usava? Já ficou com medo de mexer em sua bolsa/sacola/mochila dentro de uma loja por medo de pensarem que você roubou algo? E já teve essa mesma bolsa/sacola/mochila revistada na saída de uma loja, enquanto outros não passavam pela mesma revista?

Se você nunca passou por uma dessas situações, há grandes chances de você ser uma pessoa privilegiada.

Segundo o dicionário, privilégio é uma “vantagem ou prerrogativa, válidos apenas para um indivíduo ou um grupo, em detrimento da maioria”.

Assim, é de se pensar que um privilégio seria ter um carro, uma casa própria, até mesmo estabilidade em seu trabalho. Mas ter sua vida pessoal, sua integridade física e moral respeitadas, deveria ser um direito de todos, não um privilégio.

E agora lhe faço uma outra pergunta: O que você tem feito para aumentar os direitos e diminuir os privilégios? Qual seu papel nessa história? Você sabe diferenciar um direito de um privilégio?

São perguntas simples, mas que possuem uma profundidade enorme. Quer um exemplo?

A Constituição Federal, em seu artigo sexto, determina que “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.

Vamos à alimentação, de todos os acima, um indispensável à vida humana. Você realmente acredita que todos os brasileiros têm direito à alimentação? Não digo alimentação saudável, balanceada, com frutas, legumes, verduras e carne. Estamos falando de comida, que seja apenas o arroz puro, apenas para matar a fome.

Segundo a Organização das Nações Unidas, em 2016, o Brasil manteve uma taxa de 2,5% da população com insegurança alimentar (uma das menores do mundo, batida apenas por Cuba no continente Americano). Ou seja, mais de 5 milhões de brasileiros simplesmente acordava de manhã e não sabia se iria ou não comer naquele dia. Ou seja, a alimentação, um direito constitucional, se torna um privilégio, já que esse direito não alcança a todos.

Outra questão é a segurança: você sabia que em 2015, há cada 11 minutos, uma pessoa era estuprada no Brasil? O simples fato de você ser mulher já te coloca em situações de risco. E aí eu lhe pergunto “você já falou com seu filho sobre respeitar os outros?”.

E isso porque não coloco aqui quantos negros são tratados como se fossem bandidos, quantos homo afetivos são espancados ou mortos apenas porque estão passeando com seus namorados/namoradas, quantas pessoas são destratadas em locais de comércio por estarem mal vestidos, entre tantas outras demonstrações de preconceito e, por que não dizer, de ódio mesmo.

E é responsabilidade de cada um de nós lutarmos para garantir que direitos fundamentais sejam realmente direitos, e não privilégios.


E você? Defende direitos ou privilégios?